O homem que questiona a definição do que é realidade
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Se você acordasse um dia e descobrisse que vive em mundo virtual — que tudo o que você um dia conheceu era, como no filme Matrix, uma forma de simulação hiper-realista — o que isso significaria para suas esperanças, sonhos e experiências? Seriam elas completas mentiras, artifícios sem nenhuma autenticidade?
Para a maioria das pessoas, a resposta intuitiva a essas perguntas é “sim”. Afinal, os filmes da série Matrix ilustram um pesadelo distópico no qual a humanidade foi escravizada por máquinas sinistras. Como pensar de outra forma sobre a revelação de que a “realidade” não é nada do que parece?
Mas, para o filósofo David Chalmers, nada disso necessariamente ocorre. Ele indica que, não importa qual a situação da sua realidade, seus pensamentos e experiências permanecem os mais reais possíveis. E o valor e o propósito da sua vida também seguem intocados.
Na verdade, Chalmers afirma no seu novo livro Reality+: Virtual Worlds and the Problems of Philosophy (“Realidade+: Mundos virtuais e os problemas da filosofia”, em tradução livre) que “as simulações não são ilusões. Os mundos virtuais são reais. Objetos virtuais realmente existem.” E, quanto antes nos acostumarmos com essas ideias, mais cedo poderemos entender algumas das inquietações mais profundas da era digital.
A princípio, Chalmers não queria ser filósofo. À medida que ele crescia nos anos 1970, na Austrália, mais ele se identificava com a matemática que com a filosofia. Ele também lia muita ficção científica até que, na época em que conseguiu graduar-se em matemática e passar seis meses viajando pela Europa, ele se percebeu pensando obsessivamente na ciência da mente.
Como algo notável como a consciência poderia ser parte do mundo físico? O que o estudo científico da consciência poderia significar?
Sobre a ficção científica e os experimentos com o pensamento, Chalmers contou quando nos encontramos, no final de 2021, que “eles não ilustram apenas um problema filosófico: eles realmente fornecem incentivo para trabalhar”.
E foi o incentivo da sua fascinação pela consciência que o levou, em meio a uma graduação em matemática na Universidade de Oxford, no Reino Unido, a escrever algumas das ideias que rodopiavam na sua cabeça e enviá-las para Douglas Hofstadter — um dos pesquisadores de ciência cognitiva mais renomados do mundo — na Universidade de Indiana, nos Estados Unidos.
Hofstadter respondeu: “por que você não vem para Indiana trabalhar comigo?” Chalmers relembra a sugestão. “Existe aqui um grupo de pessoas que pensa sobre qualquer assunto: filosofia, inteligência artificial, ciências cognitivas, humor, criatividade. Para mim, parecia fantástico. Então, acabei saindo de Oxford e fui para Indiana.”
Isso foi em 1989 e Chalmers relembra que foi uma época em que a pesquisa da consciência “na verdade não estava na moda… as pessoas diziam ‘por que você está perdendo tempo pensando nesse tema velho e embolorado quando poderia estar trabalhando em inteligência artificial?'”
Mas ele estava obcecado com o assunto, o que acabou por lançá-lo em um campo onde ele tinha muitas ideias, mas pouco conhecimento formal.
“Suspeito”, contou ele, “que, se eu tivesse cursado um programa mais próximo do padrão, provavelmente teria ouvido que esta é uma ambição um pouco grande demais, vamos restringi-la. Mas ninguém me disse isso. Eles me deixaram pensar sobre essas grandes questões.” E Chalmers descobriu que o mundo estava mais do que pronto para ouvir o que ele tinha a dizer.
Em 1994, pouco depois de completar seu doutorado, Chalmers apresentou uma proposta de palestra para uma nova conferência em Tucson, no Arizona (Estados Unidos), chamada Rumo a uma Ciência da Consciência.
Os organizadores da conferência gostaram da proposta e o incluíram na primeira sessão; assim, em dado momento, Chalmers estava no palco perguntando à sua plateia: “o que precisamos explicar para explicar a consciência?”
Estabelecer uma ciência da consciência, como se poderia imaginar, era um objetivo suficientemente claro. Mas Chalmers indicava que qualquer tentativa de explicar a consciência, na verdade, acarretava não um, mas dois tipos de problemas.
De um lado, havia os problemas (relativamente) “fáceis” de explicar o comportamento: as ações objetivamente observáveis realizadas por um ser consciente, como reagir a estímulos, controlar ações e relatar estados mentais. Mas, por outro lado, existe o problema (extremamente) “difícil” de explicar as experiências subjetivas: como realmente é ter certos pensamentos e sentimentos.
Este segundo problema é difícil, principalmente porque envolve fenômenos que não podem ser medidos diretamente, nem englobados pela maioria dos modelos científicos.
A sua percepção de ser você é algo que você sabe que existe, mas também é impossível fazer com que outra pessoa a experimente, registre ou sinta. Esta posição estratégica, dependendo da sua perspectiva, é real no sentido mais evidente e está fora de qualquer outra coisa que constitua a nossa realidade.
Como Chalmers escreveu em um estudo de 1995 baseado na sua palestra, “por que o processamento físico deveria gerar uma vida interna mais rica? Parece objetivamente injustificado — e, mesmo assim, isso acontece.”
A relação entre a mente e a matéria talvez seja o enigma mais antigo da filosofia — e, com todos os avanços científicos dos últimos séculos, torna-se ainda mais misterioso se você não acreditar em almas e espíritos.
Chalmers veio trazer as questões e não respostas definitivas, mas algo sobre a sua formulação do “problema difícil” encontrou ressonância entre a sua audiência.
Essa expressão foi adotada por colegas pesquisadores, depois pela revista Scientific American e pela imprensa norte-americana. A própria conferência recebeu cobertura da imprensa internacional e começou a aumentar o interesse em torno do livro que ele estava escrevendo.
“Como disse muitas vezes”, disse ele, “não há nada de original sobre a ideia de que a consciência representa um problema difícil. Mas essa expressão acabou sendo uma forma muito eficaz de apresentar o problema como um desafio e fazer com que seja mais difícil que as pessoas o evitem.”
Ele havia trazido um tema amplo com uma clareza que merecia atenção — sugerindo diversas linhas de investigação específicas e tentadoras.
Dentre essas linhas de investigação, a principal era a da informação. O início dos anos 1990 foi uma época de ouro para a ciência da consciência, com livros best-sellers de físicos e filósofos, além de pesquisas de importantes biólogos e neurocientistas, explorando suas bases em novos termos empíricos.
O próprio pensamento de Chalmers baseava-se nessas ideias, propondo uma abordagem “não redutiva” do problema difícil com a sugestão de que todas as formas de processamento de informações acarretam um componente irredutível que constitui a base da experiência consciente.
Segundo essa perspectiva, o processamento de informações relativamente simples que tem lugar no cérebro de camundongos gera experiências relativamente simples, enquanto o processamento de informações imensamente complexo que ocorre em um cérebro humano gera experiências imensamente complexas.
E, o mais provocador de tudo, mesmo o menor tipo de processamento de informações que ocorre em um dispositivo como um termostato pode gerar um tipo mínimo de experiência.
Em outras palavras, a consciência é uma propriedade inerente do próprio universo; algo que não pode ser explicado apenas em termos de matéria. Essa teoria combinou o rigor científico com teorias amplamente imaginativas — e convocou explicitamente maiores pesquisas e debates, até pela Associação para o Estudo Científico da Consciência, da qual Chalmers foi um dos fundadores em 1996.
Quando lançou seu primeiro livro, The Conscious Mind: in Search of a Fundamental Theory (“A mente consciente: em busca de uma teoria fundamental”, em tradução livre), no final de 1996, Chalmers tornou-se um nome celebrado no seu campo de atuação.
E ele já estava trabalhando em outra teoria altamente especulativa, que ofereceria uma segunda expressão significativa para a filosofia contemporânea e colocaria a ampliação e o aprimoramento humano no centro das atenções: a mente estendida.
A mente estendida
Entre a conferência de Tucson e a publicação de The Conscious Mind, Chalmers e o filósofo britânico Andy Clark começaram a explorar juntos uma questão aparentemente simples: “Onde termina a mente e começa o resto do mundo?”
Responder a essa questão pode novamente parecer exigir pouco mais que o senso comum. O cérebro é conectado pelo sistema nervoso ao corpo — logo, o corpo é quem define os limites entre a mente e o ser. Além do esqueleto e da pele, fica o mundo exterior, cujo conhecimento somente pode ser obtido de forma indireta.
Mas Clark e Chalmers propuseram algo muito diferente: um “externalismo ativo”, baseado na hipótese de que os seres humanos são capazes de transferir aspectos do pensamento e da memória para artefatos externos e, portanto, esses artefatos podem literalmente tornar-se parte das mentes humanas.
Isso, em meados dos anos 1990 — uma época em que a Web estava na sua infância e os telefones celulares eram decididamente limitados. Um dos principais exemplos usados por Clark e Chalmers para ilustrar sua teoria era o Filofax: uma carteira organizadora pessoal cujo nome é uma abreviação da expressão “file of facts” (“arquivo de fatos”, em inglês).
Eles sugeriram que registrar ou processar informações por meio de um objeto que está sempre com você seria formar um “sistema acoplado” àquele objeto — um sistema cujas capacidades somente podem ser descritas com precisão tratando você mais aquele objeto como uma entidade única.
Como eles descreveram em um estudo conjunto intitulado The Extended Mind (“A mente estendida”, em tradução livre), “se, quando confrontamos alguma tarefa, uma parte do mundo funcionar como um processo que, se tivesse lugar na cabeça, seria prontamente reconhecido como parte do processo cognitivo, [nós reivindicamos que] aquela parte do mundo é parte do processo cognitivo… se os recursos da minha calculadora ou do meu Filofax estiverem sempre ali quando necessários, eles estarão acoplados a mim da forma mais confiável. Na verdade, eles são parte do pacote básico de recursos cognitivos que carrego no dia a dia.”
Embora eles tenham começado a trabalhar nessa questão em 1995, o estudo somente veio a aparecer, na verdade, em 1998. Chalmers explica que isso ocorreu porque “tentamos publicar em três revistas diferentes e todas elas recusaram; elas acharam que era extrema especulação”. Resultou que a especulação era profética a um grau que impressionou até os seus autores.
Segundo Chalmers, “é interessante como algumas dessas coisas mudam de totalmente implausíveis para interessantes mas especulativas, até que se tornam totalmente óbvias”. O que um dia foi um salto extremamente imaginativo tornou-se, ao longo de duas décadas, uma realidade cotidiana.
Consideremos o papel desempenhado na cognição por aparelhos como os smartphones e as formas em que, se nossos telefones forem retirados de nós, como e o que pensamos é alterado de formas incomuns. “Costumo brincar que um pedaço enorme da minha mente é composto por Google, Apple e Facebook”, observa ele. “Talvez o Google tenha 30% e a Apple tenha 20%. E esta é somente a extensão da mente comum. Quando se aplica isso a todo o nosso ambiente, acho que o potencial é muito maior.”
É aqui que atingimos o ponto de inflexão entre a ficção especulativa e as possibilidades tecnológicas que permeou toda a carreira de Chalmers — um tema que faz com que Reality+ e seu trabalho mais recente ultrapassem seus limites metafísicos.
Embora possa parecer evidente que nossas mentes tenham acesso ao mundo “real” diretamente e que qualquer ambiente virtual ou simulado seja, portanto, “irreal”, as formas como interagimos com as tecnologias do século 21 contradizem essa afirmação a todo momento.
As palavras e os mundos mostrados nas telas inspiram ferozes paixões, lealdades e ódios; moedas e produtos virtuais mudam de mãos por milhões de dólares; o aumento das experiências diárias, desde o software de mapeamento e busca até as redes sociais e os algoritmos de publicidade, molda os contornos da consciência.
Em cada caso, a questão não é se essas coisas são irreais, mas sim se são reais de forma diferente. Chalmers enfatiza que elas são “artefatos virtuais reais, experiências intermediadas reais e encontros online reais”: entidades cuja natureza e consequências somente podem ser compreendidas se deixarmos de tratá-las como abstrações.
O dilema da realidade
Logo no início do primeiro filme da série Matrix, o personagem Neo (interpretado por Keanu Reeves) enfrenta um dilema. Ele havia acabado de saber que o seu mundo, na verdade, é uma simulação dentro de uma realidade maior.
Agora, ele tem uma escolha. Ele pode tomar uma pílula azul, esquecer tudo e continuar vivendo na Matrix, como se nada tivesse acontecido. Ou ele pode tomar uma pílula vermelha e acordar na realidade “base” atrás dele.
O que ele deveria fazer? O que você faria?
Neo escolhe a pílula vermelha e sai para salvar o mundo externo e o simulado. Mas, como Chalmers indicou em um artigo de 2003 encomendado pela companhia produtora de Matrix, descobrir que você viveu toda a sua vida dentro de uma simulação realmente não invalida a “realidade” daquela vida.
Afinal, se você tivesse nascido e crescido na Matrix, por definição você nunca teria encontrado nenhum objeto não simulado, nem teria tido experiências causadas por interações não simuladas.
O que você chama de “árvore”, na verdade, é uma simulação digital. Mas, como você nunca viu uma árvore não simulada, isso significa que tudo o que você sabe sobre “árvores” pode ser tecnicamente redefinido como sendo sobre “árvores simuladas”.
A menos que você tenha subitamente recebido novos poderes de rompimento da simulação, essa revelação não é diferente de descobrir que o que você vem chamando de “árvore” tecnicamente é um “acúmulo de partículas subatômicas”, “formas de ondas quânticas que entraram em colapso” ou “energia temporariamente capturada”.
Em outras palavras, Chalmers sugere que, se eu acordasse um dia e descobrisse que estou vivendo em uma simulação, “eu não deveria concluir que o mundo externo não existe, ou que não tenho um corpo, ou que não existem mesas e cadeiras… eu deveria concluir que o mundo físico é constituído por computações em nível microfísico. Ainda existem mesas, cadeiras e corpos, mas eles são fundamentalmente compostos por bits e o que quer que constitua esses bits. Esse mundo foi criado por outros seres, mas ainda é perfeitamente real.”
Quais são as consequências disso? Entre outras coisas, Chalmers argumenta em Reality+ que a questão se estamos vivendo em uma simulação possui uma dimensão inesperadamente teológica.
Uma simulação operada por entidades superpoderosas, de muitas formas, é equivalente a um universo criado por um ser divino. E ela apresenta questões similares — até se você não seria uma das entidades superpoderosas em questão.
Que tipo de riscos e responsabilidades acompanha os poderes divinos associados a mundos simulados em operação?
Considerando que o Facebook recentemente mudou seu nome para Meta, em referência aos ambientes de imersão planejados para lançamento em breve, a questão do significado para as corporações de operar mundos nos quais elas estão próximas do onisciente e do onipotente possui dimensão surpreendentemente prática.
“Se você pensar que a privacidade e a manipulação já são um problema nas redes sociais atuais, obviamente elas terão o potencial de ser um problema muito maior quando chegarmos aos mundos virtuais criados e controlados pelas mesmas corporações”, destaca Chalmers.
E esse potencial é ainda maior quando reconhecermos que os valores, experiências, objetos e interações em jogo nesses mundos são reais.
De fato, as questões mais importantes não são sobre a realidade ou a irrealidade, mas sim sobre os tipos de experiências, ações e oportunidades fornecidas por qualquer ambiente pelo qual somos responsáveis. “Se essas forem realidades verdadeiras, nas quais você pode ter experiências significativas… que tipo de experiências significativas iremos ter?”, questiona Chalmers.
Sensação de virtualidade
Muitos filósofos e especialistas em ética defenderam nos últimos anos a importância de princípios como a privacidade, a transparência, o poder de escolha e a razoabilidade em ambientes de informação.
Mas a intensidade do foco de Chalmers sobre os horizontes mais distantes da tecnologia e em sua busca por um otimismo que não seja ingênuo com respeito aos relacionamentos humanos com essas criações é fora do comum.
Para observar o que esse otimismo poderá parecer na prática, imagine um usuário inexperiente em um ambiente virtual que, por exemplo, não saiba que o avatar com quem ele está conversando é controlado por uma inteligência artificial corporativa e não por um ser humano.
Neste cenário, uma assimetria de informação (o fato de que o usuário é profundamente iludido sobre a natureza da interação) pode estar relacionada a todo tipo de manipulação ou exploração.
Compare essa situação com um usuário experiente de um ambiente virtual que está se relacionando com avatares controlados por amigos (humanos) e com um avatar controlado por inteligência artificial que está contando histórias em um acampamento virtual.
Esta é uma perspectiva muito diferente. O que acontece aqui é um encontro potencialmente benéfico para a vida real ocorrendo em um mundo artificial. Sua satisfação é derivada de uma combinação conhecida de verossimilitude e ficção.
Em Reality+, Chalmers usa a expressão “sensação de virtualidade” para descrever as formas em que as pessoas sabem que um objeto ou ambiente é simulado e a importância dessa consciência no caso de interações ricas e significativas com ambientes virtuais.
“Acho que o conhecimento é muito importante”, segundo ele. “Quando você está interagindo com algo virtual, você sabe que é virtual; quando você interage com algo digital, você sabe que é digital. Não me surpreenderia se isso se tornasse parte dos regulamentos éticos dos mundos virtuais. Isso não significa que esses mundos virtuais não são reais. Você apenas quer saber em qual realidade você está.”
Em outras palavras, o conhecimento que você traz para uma experiência simulada é um componente vital daquela experiência — algo que se aplica igualmente a qualquer situação “real”.
Em qualquer caso, estar mal informado ou ter pouca informação é ser vulnerável a vários tipos de manipulação, enquanto ter opções significativas, poder de escolha e conhecimento é ter poder.
Isso nos traz à lição talvez mais séria e significativa de todas: quando a questão é a consciência, os seres humanos são, ao mesmo tempo, brilhantes e profundamente vulneráveis. Incontáveis aparelhos, sistemas e incentivos ambientais estão constantemente alterando e ampliando as nossas mentes.
Nós não conseguimos ter acesso nem mesmo à realidade “base” diretamente pelos nossos sentidos. Isso significa que todo e qualquer momento que experimentamos é inicialmente mais aberto e desconhecido que a intuição facilmente nos faz acreditar.
A cegueira da mudança
Perguntei a Chalmers quais são alguns dos pontos que mais o surpreenderam ou entusiasmaram com a nossa crescente compreensão da consciência. Ele respondeu que um exemplo que vem à mente é a pesquisa sobre o que é conhecido como “cegueira da mudança”.
A cegueira da mudança descreve as formas como as pessoas podem realmente ficar “cegas” até para mudanças substanciais no que está à frente delas, a menos que estejam especificamente procurando essas mudanças.
Em um experimento de 1998, por exemplo, os pesquisadores iniciaram uma conversa com um pedestre e, em meio à conversa, sutilmente substituíram o primeiro pesquisador por uma pessoa diferente que prosseguiu conversando.
Apenas a metade dos pedestres chegou a observar a mudança. Essa notável descoberta foi reforçada por cada vez mais pesquisas que indicam que as pessoas podem ter consciência de “muito menos do que pensávamos”, nas palavras de Chalmers.
Aparentemente, nossa consciência diária do mundo é detalhada, suave e constantemente atualizada. Mas esta é pouco mais que uma ilusão útil.
“Nós achávamos que tínhamos consciência de tudo, de todos os detalhes de um quadro; mas o resultado é que talvez tenhamos consciência de apenas sete bolhas às quais prestamos atenção. Sempre que prestamos atenção, elas estão lá. Mas [pelo menos com relação à consciência] nem sempre elas estão lá.”
Nossas mentes e percepções, em outras palavras, são fundamentalmente não literais nas suas leituras da realidade — embora a própria percepção seja um tipo de ilusão evoluída, suficientemente útil e precisa para proteger nossa sobrevivência, mas nada tão abrangente quanto parece.
Os mundos virtuais e a mediação tecnológica, neste sentido, já são um tipo de segunda natureza no que se refere à humanidade; os ambientes e encontros não possuem significado maior nem menor que nada do que experimentamos. Afinal, a própria informação é a realidade que interessa.
O que Chalmers escolheria com relação à sua própria realidade? Ele gostaria de viver — ou de saber que já estamos vivendo — em uma simulação?
“Eu ainda não me decidi”, afirma ele. “Por um lado, existe algo muito interessante na ideia de estar na realidade base. Existem todas essas simulações, mas a realidade base é um lugar especial e muito interessante. Mas, por outro lado, se estivermos em uma simulação, o universo é muito maior e mais grandioso que havíamos pensado.”
De certa forma, essa linha de pensamento parece autobiográfica — uma versão da curiosidade incessante que levou Chalmers a cruzar meio mundo e que Reality+ mapeia ao longo de uma sucessão de frases filosóficas, provocações e parábolas.
Como ele próprio diz para encerrar nossa conversa: “fui criado na Austrália e descobri que, em algum momento, meu Deus, existe todo um mundo lá fora que eu preciso explorar. Acho que saber que existe um mundo fora do nosso próprio universo, talvez onde nós possamos explorar em princípio, abriria horizontes e possibilidades interessantes e emocionantes.”
E este é o seu veredito sobre aquela palavra enganosa, “realidade”, e por que ela precisa ser seguida por “mais” no título do seu livro, para englobar tudo o que ele está querendo dizer: “acho que gostaria de dizer… que a realidade é ampla. O espaço é grande. Mas a realidade é maior.”
* Tom Chatfield é um escritor e filósofo da tecnologia britânico. Seu livro mais recente é “How to Think: Your Essential Guide to Clear, Critical Thought” (“Como pensar: seu guia essencial para o pensamento crítico claro”, em tradução livre), da editora norte-americana SAGE Publishing.
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